O Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma condição que faz parte da vida de milhões de famílias brasileiras. Caracterizado por desafios na comunicação e padrões de comportamento repetitivos, o autismo exige um olhar atento e suporte especializado para que cada pessoa possa desenvolver seu potencial ao máximo.
Nos últimos anos, o número de diagnósticos cresceu de forma expressiva. Estimativas do Centro de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos EUA indicam que uma em cada 31 crianças está no espectro, o que, no Brasil, poderia representar quase 6 milhões de pessoas.
Esse cenário traz uma nova realidade para as operadoras de planos de saúde, que se veem diante da necessidade de cobrir tratamentos contínuos e multidisciplinares.
Terapias como a Análise do Comportamento Aplicada (ABA), fonoaudiologia e terapia ocupacional são a base do tratamento e precisam ser intensivas e, muitas vezes, durar anos.
Não é surpresa que esses atendimentos possam representar até 80% dos custos de um beneficiário autista, gerando uma forte pressão sobre a sustentabilidade financeira dos planos de saúde.
Os desafios no caminho das operadoras
Para as operadoras, a gestão do cuidado de pessoas com TEA envolve uma série de desafios complexos:
- Custos elevados: em alguns casos, os gastos com pacientes no espectro já ultrapassam os da oncologia, que historicamente é uma das áreas mais caras da saúde suplementar.
- Busca por direitos na Justiça: milhares de famílias recorrem ao sistema judiciário para garantir a cobertura integral das terapias. E a justiça tem ficado do lado delas: cerca de 90% das ações são favoráveis aos pacientes, especialmente para assegurar o acesso a métodos essenciais como o ABA.
- Falta de profissionais qualificados: o Brasil ainda enfrenta uma carência de especialistas em ABA e outras áreas focadas no autismo. Instituições como a Universidade Federal de São Carlos (UFSCar) oferecem programas de pós-graduação, mas a demanda ainda é muito maior que a oferta.
- Novas regras da ANS: a Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS) ampliou as obrigações de cobertura. Desde 2022, qualquer método ou técnica indicado pelo médico para o tratamento do TEA deve ser coberto, sem limite de sessões, o que representa uma grande vitória para as famílias, mas um desafio de gestão para as operadoras.
Encontrando soluções: o que as operadoras estão fazendo?
Diante desse cenário, muitas operadoras estão deixando de ser reativas e passando a criar estratégias para melhorar a qualidade do atendimento, reduzir conflitos judiciais e equilibrar as contas.
Um estudo da Unimed Federação Minas aponta um caminho com seis eixos principais:
1. Mapeamento e segmentação da carteira
O primeiro passo é mapear o perfil dos beneficiários com TEA. Entender quantos são, suas idades e quais suas principais necessidades ajuda a prever custos e a criar programas de apoio mais eficazes.
2. Fortalecimento da rede de apoio
É fundamental garantir que as famílias tenham acesso a clínicas e profissionais capacitados. Boas práticas incluem parcerias para criar centros de referência, como a da GenialCare com grandes seguradoras, e até o compartilhamento de clínicas especializadas entre operadoras para dividir custos e aumentar a eficiência.
3. Investir em quem cuida
A capacitação de médicos, psicólogos e terapeutas é fundamental. Quando os profissionais da rede são sensibilizados e treinados em protocolos baseados em evidências, a qualidade das prescrições melhora e o uso de tratamentos sem comprovação científica diminui.
4. Alinhamento entre médicos e terapeutas
Muitas vezes, o que o médico prescreve e o que o terapeuta executa não estão alinhados. Criar canais de comunicação e revisar os planos terapêuticos periodicamente evita um tratamento fragmentado e mantém o foco nos resultados que realmente importam para o desenvolvimento da criança.
5. Estar em dia com as exigências regulatórias
Acompanhar as mudanças na legislação é essencial para evitar negativas indevidas que acabam em processos judiciais. As regras da ANS são claras: terapias indicadas por um médico devem ser cobertas sem limite de sessões.
6. Um cuidado que vai além da clínica
O apoio a uma família com um membro no espectro autista não é apenas clínico. Operadoras como a Bradesco Saúde e a Care Plus já oferecem centrais de atendimento que orientam sobre o diagnóstico, as terapias e até o suporte educacional, mostrando um cuidado mais completo e humanizado.
Um olhar para o futuro: união entre gestão, inovação e humanização
O futuro do cuidado ao TEA na saúde suplementar depende da união entre acolhimento humanizado, redes especializadas e gestão sustentável.
As operadoras que investem na qualificação de seus profissionais e estabelecem uma comunicação transparente com as famílias já colhem os frutos, com menos processos na justiça e clientes mais satisfeitos.
No fim das contas, oferecer um cuidado estruturado para o autismo deixou de ser apenas uma obrigação legal para se tornar um diferencial estratégico.
Em um mercado onde a demanda só cresce, as empresas que conseguirem equilibrar qualidade, inovação e sustentabilidade não apenas se destacarão, mas construirão uma relação de confiança com seus clientes e ajudarão a construir uma sociedade mais inclusiva para todos.
Referências utilizadas na produção deste artigo:
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Resolução Normativa nº 539, de 23 de junho de 2022. Brasília: ANS, 2022.
Agência Nacional de Saúde Suplementar (ANS). Resolução Normativa nº 541, de 11 de julho de 2022. Brasília: ANS, 2022.
Boarati, V. et al. A judicialização da saúde infantil: estudo de decisões judiciais no Estado de São Paulo. Relatório Técnico – INSPER, 2023.
Bradesco Saúde. Programa de Acolhimento TEA. Relatório Institucional, 2024.
Care Plus. Programa Cuidado da Família. São Paulo, 2024.
CDC – Centers for Disease Control and Prevention. Autism and Developmental Disabilities Monitoring Network. Atlanta, 2025.
Dopazo, M. A. et al. Transtorno do Espectro Autista: uma estratégia para o gerenciamento pelas Operadoras de Plano de Saúde. Rev. Bras. Saúde Suplementar, 2025.
Fujita, V. Autismo e operadoras de saúde: nem mocinho, nem vilão. Revista Medicina S/A, 2024.
GenialCare. Relatório de Impacto Social 2024. São Paulo, 2024.
IBGE. Censo Demográfico 2022: Pessoas com Deficiência e Transtorno do Espectro Autista. Rio de Janeiro: IBGE, 2022.
UFSCar – Universidade Federal de São Carlos. Programa de Pós-Graduação em ABA. São Carlos, 2023.
Unidas. Cartilha de Boas Práticas de Operadoras de Saúde para Autistas. Brasília: Unidas, 2023.












